A Tabaqueira pode ver reforçado o investimento por parte da acionista Philip Morris International, se existir uma visão alinhada com o Governo português em relação aos produtos de tabaco alternativos, destaca Massimo Andolina. Responsável diz que 20% dos fumadores portugueses já fizeram a transição para o tabaco sem fumo, que segundo os especialistas apresentam menos perigo para a saúde, embora não sejam isentos de risco.
A Tabaqueira, subsidiária da Philip Morris International em Portugal, atingiu os 820 milhões em exportações e passa assim a integrar o top10 dos principais grupos exportadores em Portugal. Massimo Andolina, presidente da PMI para a Europa e presidente do Conselho de Administração da Tabaqueira EIT, destaca que plano passa por continuar e reforçar esse investimento em Portugal mas alerta que é necessária uma visão alinhada com o Governo. Sendo Portugal uma “fonte de talento tradicional” para a Philip Morris, o planos passam por dotar a Tabaqueira de investimentos que permitam que a unidade possa começar a produzir produtos alternativos sem fumo, a visão para o futuro delineada por este responsável.
A indústria está a sofrer uma enorme transformação. Que papel desempenha a Philip Morris International nesse contexto?
Na nossa perspetiva, a mudança na indústria está a correr bem e o processo de transformação da empresa também acompanha essa tendência. Teve oportunidade de analisar os resultados mais recentes que publicámos. No nosso entender, esses números marcam um contínuo progresso para que os fumadores deixem os cigarros. E como referiu o nosso CEO, e muito bem, com os produtos inovadores que existem, nesta altura os cigarros já deviam ser uma peça de museu. Estamos a liderar nessa transformação e neste momento, 12 milhões de pessoas na Europa que mudaram para o IQOS (linha de tabaco aquecido e cigarros eletrônicos fabricados pela Philip Morris International). O nível de progresso é bom e estamos extremamente satisfeitos com o número de pessoas que têm feito a mudança dos cigarros para os produtos alternativos. É muito encorajador. No início deste ano, o IQOS já tem uma quota de 10,3% na Europa e essa é uma grande conquista. O IQOS já é a principal marca de nicotina em sete países e é a segunda nos restantes, ficando atrás da Marlboro que é a nossa marca histórica. Apesar de ser um enorme progresso, temos um longo caminho a percorrer e há que converter 85% dos consumidores que ainda preferem o cigarro. Na Europa, temos como objetivo atingir 50% das receitas em produtos livres de fumo até 2025. Recentemente, atualizámos esse objetivo para 75% das receitas até 2030. Neste momento, 42% das receitas da Philip Morris na Europa são provenientes de produtos livres de fumo. Se alguém questionar se estamos a ser sérios neste compromisso, os factos falam por si. Apesar de estarmos confiantes no caminho que estamos a trilhar, não podemos descansar porque acreditamos que em muitos países há muito para fazer. Nos 27 países da União Europeia, o grau de abertura relativamente a produtos alternativos ao cigarro como uma solução para combater o problema do tabagismo ainda deve ser aumentado. O nível de abertura e consciencialização entre os fumadores difere muito nos países europeus.
Essa consciencialização deve ir além da indústria?
A indústria tem um papel importante a desempenhar mas não é um trabalho que possamos fazer sozinhos. É necessário que haja uma conjugação de esforços por parte dos políticos, reguladores, cientistas e da sociedade em geral no sentido de reconhecerem que a inovação é muito importante na indústria do tabaco. Falando de consciencialização, algo que defendemos é a necessidade de informar os fumadores de que existem alternativas. É lamentável ver que ainda hoje essa capacidade de criar consciencialização é muito desigual nos 27 países da União Europeia. Temos países esclarecidos como é o caso de Portugal mas temos outros em que existe essa necessidade. E é em países como Portugal, Itália, Grécia, Chéquia e Eslováquia que vemos uma evolução na adoção de produtos alternativos. Infelizmente, noutros países, produtos como o IQOS são tratados da mesma forma que o cigarro e aí, estamos a restringir a capacidade de informar e de criar essa consciencialização. França é um desses países e aí temos 12 milhões de fumadores, um dos países com mais fumadores em toda a Europa. É um desafio difícil.
E Portugal é um exemplo nesse aspeto?
Na Europa, é um dos principais mercados neste momento. E lidera porque os reguladores estabeleceram diferenças não só no campo regulatório como também na vertente fiscal. Isso permitiu que o fumador está ciente da existência destes produtos alternativos e isso facilita a transição. No mercado português, o iQOS tem uma quota de mercado de cerca de 20%, o que significa que um fumador em cinco já fizeram essa mudança. Temos 500 mil clientes que já mudaram para o IQOS, falta convencer o restante universo de fumadores. Portugal é um mercado que me transmite muito otimismo. É bonito ver que em Lisboa os consumidores de cigarros estão a tornar-se uma minoria e como aqueles que fizeram a transição tentam convencer esses fumadores a fazer o mesmo.
Ainda assim, que trabalho é necessário fazer junto do Governo português?
Há margem para acelerar um alinhamento claro com o Governo português e acrescento que é possível robustecer esse alinhamento. O Governo português tem mostrado ter uma mente aberta neste campo. Diria que há aqui uma oportunidade para o novo Governo em Portugal, até para se destacar ao nível europeu.
E é aqui que entra a Tabaqueira e o investimento da Philip Morris em Portugal?
A Tabaqueira tem uma enorme importância para a Philip Morris Europa. Não é apenas uma das maiores fábricas mas também alberga vários centros de excelência. E não é importante apenas pelos seus resultados comerciais mas também pelo investimento que temos canalizado para Portugal e pelos mercados que essa unidade serve. Sempre confiei muito na Tabaqueira e foi com naturalidade que se tornou o primeiro centro de especialização, sendo que esse processo de consolidação também foi estendido a outras afiliadas na Europa. Hoje temos na Tabaqueira um dos nossos maiores centros de tecnologia da informação, onde temos pessoas que, por exemplo, desenvolvem o software necessário para executar todas as atividades comerciais e interagir com os consumidores. A Tabaqueira tornou-se um exportador de bens e de serviços e em 2023 superou os 800 milhões de euros nessas vendas internacionais. Praticamente 90% do que produzimos em Portugal é para exportação e vai para uma grande variedade de mercados: Espanha, Itália e França. Tudo o que temos em Portugal é de alta qualidade e muito dessa qualidade passa pelos quadros que somos capazes de contratar e de reter no país. Portugal é tradicionalmente uma das fontes de talento para nós. Temos profissionais portugueses em todo o universo da Philip Morris, como acontece na nossa sede em Lausanne e a desempenhar uma série de tarefas. É uma história muito bonita a que temos com Portugal.
O investimento na Tabaqueira é para continuar?
Sem dúvida, continuamos a investir na Tabaqueira e não há nenhuma razão para não continuar nesse caminho, especialmente devido aos excelentes quadros que temos em Portugal. Mas para que esse caminho continue e para que seja possível mantermo-nos no trilho da inovação, longe dos cigarros e na aposta dos produtos sem fumo, é necessário ter uma visão para o futuro alinhada com o Governo português. Portanto, defendemos uma visão na qual este Governo seja um forte defensor de produtos alternativos e inovadores para tirar pessoas do tabagismo. Neste momento, estamos a conversar com o novo Governo. Pessoalmente, acredito que possa haver uma transição da Tabaqueira para se tornar numa unidade essencial no desenvolvimento de produtos livres de fumo mas um alinhamento dessa visão é particularmente importante.
Portanto, a intenção passa por continuar a investir em Portugal?
Sim, investimos entre 15 a 20 milhões de dólares na Tabaqueira todos os anos e acreditamos que Portugal pode ser destino de investimentos ainda maiores se considerarmos a possibilidade de uma mudança no perfil da Tabaqueira para os produtos inovadores. E temos vindo a fazer grandes investimentos. Investimentos numa grande variedade de tecnologias como painéis solares que geram energia solar inteiramente utilizada na nossa atividade produtiva; destaco outros investimentos destinados à redução de resíduos, uso mais responsável de recursos e conservação. Estes investimentos são para continuar. Mas o que estamos focados é na transição da Tabaqueira para o fabrico de novos produtos.
E na ajuda na disseminação da informação sobre os produtos livres de fumo?
Correto. Cada Governo, especialmente no contexto da União Europeia, desempenha um papel duplo: na criação do quadro regulamentar a nível interno mas também na forma como pode influenciar a regulamentação na União Europeia que eventualmente pode vir a ser adotada pelos países. Consideramos que o Governo português é um parceiro muito esclarecido no que diz respeito à regulamentação interna e esperamos que a sua voz seja ouvida no plano europeu. Esta transformação da indústria toca uma série de aspetos e até influencia a reindustrialização na Europa, assim como a inovação e a ciência. Ter um Governo português mais vocal sobre os produtos alternativos da indústria é particularmente importante.
Pode dar um exemplo desse papel governamental?
Existem várias decisões que estão a ser tomadas na Europa a propósito desta indústria: umas podem ajudar mas outras podem ser destrutivas. Um exemplo? A Comissão Europeia alargou a proibição de aromas que já existia nos cigarros desde 2020 para produtos inovadores. O que sabemos é que os sabores têm um papel comprovado em facilitar a transição dos cigarros para os produtos inovadores. A consequência disso é que muitas pessoas que já tinham feito a transição para o IQOS começam a considerar a possibilidade de voltar aos cigarros convencionais. Aparentemente, uma medida bem intencionada alcança o resultado oposto. E é aqui que os Estados membros mais esclarecidos têm uma palavra a dizer. Há discussões na União Europeia sobre a harmonização da regulamentação a propósito das bolsas de nicotina que passa pela proibição do produto na Europa. Definitivamente, não é a coisa certa a fazer. Devemos olhar para o “snus”, por exemplo, e como na Suécia tem tirado pessoas do tabagismo. Há 30 anos, a Suécia tinha uma prevalência de tabagismo igual à do resto dos países europeus, cerca de 25% Hoje baixou essa prevalência para 5% e houve uma redução de doenças oncológicas ligadas ao tabagismo e a menor incidência de cancro pulmonar em toda a Europa. Porque não aprender com os bons exemplos, certo?
Está otimista nessa mudança?
Sou sempre otimista. Acredito que esta trajetória pode ser mais inspirada na ciência do que na ideologia. Se nos inspirarmos na ciência e nos factos para elaborar regulamentações, podemos trilhar este caminho rapidamente. A larga maioria dos países na Europa a da União Europeia adotaram alternativas como uma oportunidade para combater o tabagismo. Há uma minoria de países que se mantêm expectantes mas acredito que seja apenas uma questão de tempo.