Sem perfume ou desodorizante, o mundo tende a tornar-se um pouco diferente. E até as escolhas amorosas podem seguir lógicas diferentes. “Mascaramos os nossos odores ao usar perfume e desodorizante e, portanto, aquele tipo de escolha que é feito a partir da qualidade intrínseca do parceiro deixa de acontecer e está mais relacionado com o facto de gostarmos daquele tipo de perfume ou não”, responde Susana Lima, investigadora da Fundação Champalimaud no podcast Futuro do Futuro.
Qualquer humano poderá apreciar um perfume ou um desodorizante, mas isso não significa que essa preferência se reflete diretamente na escolha de um parceira sexual. Até porque esse processo pode ser determinado também por outros estímulos além do cheiro. De qualquer modo, o recurso a odores artificiais implica uma sobreposição dos cheiros que um corpo emana naturalmente – e de algum modo pode limitar a informação disponível que contribui para a escolha final.
“Estamos, de certa maneira, a enganar o sistema e a levar a que as escolhas sejam feitas de outra maneira”, refere Susana Lima.
Susana Lima tem vindo a investigar a vida sexual de ratinhos de laboratório com o objetivo de apurar os motivos que levam as fêmeas a rejeitar ou a escolher um parceiro sexual, e ainda os mecanismos que determinam a ejaculação dos machos.
A aceitação de um macho depende do ciclo de fértil, mas a escolha entre diferentes candidatos pode ser influenciada por aquilo que dita o olfato, com especial destaque para as fêmeas, que são quem tem a última palavra. “O que nós pensamos é que elas estão a tentar perceber não só a qualidade do macho, mas também a tentar acasalar com animais que não sejam próximos geneticamente deles”, refere ainda a cientista.
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Apesar de estar focada no estudo dos ratinhos, Susana Lima admite que as conclusões do seu estudo possam produzir lógicas similares nos humanos, na hora de procriar. “Há duas coisas que acontecem durante a escolha do parceiro e que também acontecem em humanos: estamos a tentar escolher não só um parceiro que tenha a melhor qualidade para a nossa progenia (filhos e crias), mas também um parceiro que esteja o mais distanciado de nós geneticamente”, refere a investigadora.
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Em resposta aos dois desafios que costumamos apresentar no Futuro do Futuro, Susana Lima trouxe uma imagem obtida a partir do músculo responsável pela ejaculação em ratinhos, e ainda o tema “Relaxin’ With Cherry” dos Kid Loco, para ilustrar a forma como machos e fêmeas de ratinhos acasalam.
“Há quem comece pelo cérebro e nós decidimos começar, pelo fim, com o ponto final do comportamento, que é a ejaculação”, refere a cientista.
Mulheres e fêmeas de ratinhos seguem lógicas diferentes na escolha e na rejeição de parceiros, enquanto que nos machos das duas espécies tendem a ter mais semelhanças: “Estamos a tentar perceber como é que o macho do ratinho chega a ejaculação. E aí, os circuitos neuronais são muito parecidos, com os de um humano”, refere Susana Lima.
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Susana Lima recorda também os estudos que demonstraram que os ratinhos tendem a ejacular mais rapidamente com parceiras sexuais que têm odores similares aos das mães, enquanto os cuidados maternais das progenitoras podem influenciar a forma como as fêmeas se comportam sexualmente.
Num estudo que deixa em aberto a investigação noutras espécies animais, Susana Lima dá ainda uma descrição do principal feito científico alcançado pela equipa que lidera na Fundação Champalimaud: “Descobrimos uma área (do cérebro) que está envolvida na rejeição. As fêmeas, quando não estão na fase fértil, além de de não mostrarem postura recetiva que permita que haja a cópula, podem rejeitar o macho ativamente. Podem dar pontapés, podem dar socos, caso o macho seja muito insistente e queira ter sexo com essa fêmea”, refere a cientista.
“A nossa contribuição é a descoberta de um novo núcleo no hipotálamo, que coordena este tipo de rejeição”, conclui a cientista.
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