Em 2023, o público português teve a oportunidade de a conhecer por meio da leitura de “Esperando a Subida das Águas”, editado pela Quetzal. Mas Maryse Condé era há muito citada ano após ano enquanto possível candidata ao Nobel da Literatura. Em 2018, chegou mesmo a ser distinguida com o Prémio New Academy, um ‘Nobel alternativo’. O seu último livro, “O Evangelho do Novo Mundo”, publicado por cá em fevereiro deste ano pela Livros do Brasil, converteu-a na mais idosa finalista da história do International Booker Prize. A autora tinha 86 anos e já sofria de uma doença neurodegenerativa, ao ponto de ter ditado o texto deste romance ao marido, o tradutor Richard Philcox. Maryse Condé morreu esta terça-feira desse mesmo mal.
Grande senhora das letras francófonas, que em 2020 recebeu das mãos do presidente Macron a Grã-Cruz da Ordem Nacional do Mérito, deixa o rasto de um longo catálogo, com uma vintena de romances publicados desde o início da sua carreira literária, em 1976, além de peças teatrais, ensaios e literatura infantil.
Maryse Condé – que nasceu Marise Liliane Appoline Boucolon – veio ao mundo em Guadalupe, em 1934. Completou os noventa anos há dois meses. Tendo feito o secundário em Paris, prosseguiu estudos na Sorbonne, onde se doutorou em Literatura Comparada. O seu ativismo marxista levou-a a lecionar, entre 1960 e 1972, na Costa de Marfim, no Senegal, na Guiné-Conacri e no Gana, de onde seria deportada por motivos políticos.
Em 1976, aos 40 anos, escreveu o primeiro romance, “Hérémakhonon”, mas seria apenas com terceiro, intitulado “Ségou”, que ganharia projeção internacional. Foi graças a este livro que ganhou uma bolsa Fullbright para ensinar literatura nos Estados Unidos, nomeadamente na Universidade de Columbia, em Nova Iorque. Passaria também pelas de Virginia e da Califórnia antes de se reformar, em 2005.
Em 2019, Condé escreveu na “New Yorker” sobre a surpresa de lhe ter sido outorgado o New Academy Prize. Nesse artigo, comentava que “há anos” escrevia sem qualquer reconhecimento especial, nem sequer vindo da esfera francesa, que jamais a nomeara para galardões como o Goncourt, o Femina ou o Renaudot. E rematava: “Estou contente e profundamente orgulhosa por ser uma guadalupense que fez ouvir a sua voz (…). Isto dá-me esperança de que a voz de Guadalupe, apesar dos infortúnios da ilha, continue a ser poderosa, continue a ser mágica e continue a ter o poder de dizer não.”