À medida que as tropas israelitas avançam progressivamente em direção às zonas centrais de Rafah, assumindo novas posições e efetuando novas manobras ao longo da cerca da fronteira sul com o Egito, segundo testemunhos reunidos pela Al Jazeera, o Governo de Benjamin Netanyahu sofreu, esta quarta-feira, mais um duro golpe político, depois de ter começado a semana da pior forma com o pedido de mandado de captura internacional emitido pelo Tribunal Penal Internacional (TPI) contra o primeiro-ministro israelita e o seu ministro da Defesa, Yoav Gallant, e que abrange também três altos funcionários do Hamas, Yahya Sinwar, líder militar do Hamas em Gaza, Mohammed Diab Ibrahim al-Masri, líder das Brigadas Al-Qassam e Ismail Haniyeh, líder político do Hamas.
Os chefes dos Governos de Espanha, da Irlanda e da Noruega revelaram que vão reconhecer formalmente a Palestina como Estado, numa ação concertada entre os três países, estando a oficialização da decisão marcada para 28 de maio, de acordo com a Lusa. Pedro Sánchez anunciou, esta quarta-feira, no Congresso dos Deputados, que o Conselho de Ministros espanhol vai dar luz verde à resolução na próxima semana. “Os países que defendem os direitos humanos são obrigados a agir na Ucrânia e na Palestina, sem duplicidade de critérios”, declarou o primeiro-ministro espanhol, argumentando que “Netanyahu não tem um plano de paz para a Palestina” e que “a ofensiva [israelita] só perpetuará o ódio”.
Na República da Irlanda, a notícia foi comunicada pelo primeiro-ministro, Simon Harris, que afirmou que o reconhecimento da independência da Palestina é “uma declaração de apoio inequívoco a uma solução baseada na existência de dois Estados – a única via credível para a paz e a segurança de Israel, da Palestina e dos seus povos” e “a única forma de sair de ciclos geracionais de violência, retaliação e ressentimento”.
O primeiro-ministro norueguês deu conta, igualmente, da intenção da Noruega de reconhecer o Estado da Palestina a 28 de maio. Jonas Gahr Støre observou que “não pode haver paz no Médio Oriente se não houver esse reconhecimento”. “O reconhecimento da [independência da] Palestina é um meio de apoiar as forças moderadas que têm vindo a perder terreno neste conflito prolongado e brutal”, sustentou o chefe do Governo de Oslo, acrescentando que “a guerra em curso em Gaza deixou bem claro que a obtenção da paz e da estabilidade tem de assentar na resolução da questão palestiniana”.
Espanha e Irlanda juntar-se-ão, assim, aos 11 Estados-membros da União Europeia (UE) que já reconhecem formalmente a Palestina: Bulgária, Chipre, República Checa, Hungria, Malta, Polónia, Roménia, Suécia e Eslováquia, segundo a Lusa. A Noruega não é membro da UE, mas tal como os dois países anteriores, somar-se-á aos 137 de 193 membros das Nações Unidas que já deram este passo unilateralmente, de acordo com a Autoridade Nacional Palestiniana.
Portugal espera por maior consenso entre a UE
Portugal também pretende reconhecer a soberania da Palestina, mas está a tentar obter o maior consenso possível entre os Estados-membros da UE, indicou à Lusa fonte do Ministério dos Negócios Estrangeiros, referindo que o país está “em consultas com vários Estados para (…) trazer o maior número de países para a solução” de dois Estados. A posição de Portugal já havia sido avançada pelo ministro dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel, que, em entrevista ao diário espanhol ‘El País’ no passado dia 12, disse que o Governo português está à espera “do momento mais oportuno para dar esse passo”.
A posição do executivo de Luís Montenegro está em linha com a do anterior executivo. No final de 2023, o então ministro João Gomes Cravinho, disse à Lusa que o reconhecimento do Estado da Palestina por Portugal “é algo que deve acontecer”, mas em coordenação com “alguns parceiros próximos” e num “momento com consequências para a paz”.
A decisão foi saudada pelos dirigentes palestinianos, nomeadamente o Presidente da Autoridade Nacional Palestiniana (ANP), Mahmoud Abbas, que descreveu a decisão como a “consagração do direito do povo palestiniano à autodeterminação na sua terra”. O secretário-geral da Organização de Libertação da Palestina (OLP), Husein al-Sheikh, também disse tratar-se de “um momento histórico após longas décadas de luta nacional palestiniana, sofrimento, dor, ocupação, racismo, assassínio, opressão, abuso e destruição”.
Já o embaixador palestiniano na ONU, Riyad Mansour, mostrou-se esperançoso de que o reconhecimento da soberania da Palestina pelos três países, que caracterizou como um “grito massivo internacional” e um “investimento na paz”, possa instigar “outras ondas de apoio” a nível internacional. Vários líderes de países árabes, solidários com a causa palestiniana, como Qatar, Egito, Jordânia e Arábia Saudita, congratularam-se igualmente com o anúncio.
Também o Hamas se pronunciou em relação àquele que considera ser “um ponto de viragem na questão palestiniana”. À AFP, Bassem Naim, alto funcionário do gabinete político do Hamas, disse que o anúncio de Espanha, Irlanda e Noruega é “resultado direto da resistência corajosa e da lendária firmeza do povo palestiniano”.
As reações por parte de Israel não se fizeram esperar. Para o chefe da diplomacia israelita, citado pela AFP, os três países pretendem “enviar uma mensagem aos palestinianos e a todo o mundo: o terrorismo compensa”. Israel Katz disse que, “depois de a organização terrorista Hamas ter perpetrado o maior massacre de judeus desde o Holocausto (…) estes países optaram por recompensar o Hamas (…) e reconhecer um Estado palestiniano”.
O governante foi mais longe nas suas críticas e considerou que “a Espanha, a Noruega e a Irlanda decidiram atribuir uma medalha de ouro aos assassinos e violadores do Hamas”. Também o primeiro-ministro israelita assinalou que o reconhecimento dos três países “é uma recompensa pelo terrorismo” e “não trará paz à região”. “Este mal não deveria receber um Estado. Será um Estado de Terror. Tentará repetidamente levar a cabo o massacre de 7 de outubro, e não o permitiremos”, disse Benjamin Netanyahu, num vídeo divulgado pelo seu gabinete.
Tal como aconteceu com o pedido de mandado de captura para os governantes israelitas, o reconhecimento do Estado da Palestina por parte dos três países voltaram a evidenciar as divisões existentes entre os países da UE, com França e Alemanha a dizerem que não consideram ser este o momento adequado para a decisão anunciada. O chefe da diplomacia alemã disse que a independência da Palestina é “um objetivo firme da política externa alemã”, mas acrescentou que tal não se concretizará sem um processo de diálogo. Também os EUA defendem que o reconhecimento do Estado da Palestina “deve ser realizado através de negociações diretas entre as partes” e não “de forma unilateral”, disse um porta-voz do Conselho de Segurança Nacional dos Estados Unidos à CNN.
OUTRAS NOTÍCIAS QUE MARCARAM O DIA:
⇒ O líder da Câmara dos Representantes dos EUA anunciou que vai convidar Benjamin Netanyahu para falar ao Congresso, honra geralmente reservada aos aliados mais próximos dos EUA ou a grandes nomes mundiais, de acordo com a CNN. Mike Johnson, que já havia manifestado a vontade de levar o primeiro-ministro israelita a discursar perante os legisladores norte-americanos, lança, assim, mais um sinal de conciliação entre os dois aliados, depois de a Administração Biden ter revelado, na terça-feira, que pretende “tomar as medidas adequadas” para responder ao requerimento do TPI contra os governantes israelitas.
⇒ Os ministros da Arábia Saudita, Egito, Jordânia, Qatar e Emirados Árabes Unidos vão reunir-se com os seus homólogos da UE em Bruxelas, na segunda-feira, para debater a guerra em e os esforços de paz, informou o representante especial da UE para o processo de paz no Médio Oriente, citado pela Reuters. Sven Koopmans explicou que este será um de parte de vários encontros em que os países árabes e europeus tentam encontrar posições comuns sobre as formas de pôr fim ao conflito entre Israel e o Hamas.