O Pilatos nacional
As posições do Presidente da Assembleia da República no exercício das suas funções não são equivalentes a qualquer conversa de café. Como elemento da hierarquia do Estado, a sua aquiescência passiva a qualquer intervenção adquire particular gravidade.
Não permitir excessos de qualquer tipo não pode ser confundido com limitação à liberdade de expressão, porque a liberdade, para que exista efectivamente, tem de ter regras que me impeçam de a usar para atentar contra a liberdade e a dignidades dos outros. Pelos vistos a liberdade de tratamento informal dos deputados preocupa (e bem) o presidente da AR, mas advertir os mesmos quando se usam graçolas xenófobas já será colidir com a liberdade de expressão; para Aguiar-Branco os salamaleques são mais relevantes do que a passividade perante o discurso racista.
A derrapagem dos sociais-democratas para tentarem rivalizar com a extrema-direita põe em causa o próprio cerne da sua existência. Não, senhor presidente, não é a lavar as mãos como Pôncio Pilatos que evitaremos que mais Cristos sejam crucificados.
José Cavalheiro, Matosinhos
Os mandriões
Subliminarmente, André Ventura chamou mandriões, não foi aos turcos, foi aos portugueses. Vendo as suas declarações a frio, ao dizer que os mandriões turcos levam cinco anos, e nós levamos dez, nós somos mandriões ao quadrado. Agora convinha que o “iluminado” dissesse onde está o problema. Será no Governo? Será nos engenheiros? Será nos operários?!
Nos operários não é seguramente, porque em Portugal não temos gente para fazer aeroporto, o TGV, mais uma ponte sobre o Tejo e a habitação que está em falta. Terão de vir de África ou talvez da Turquia. Também é preciso saber de onde vem o dinheiro. Quando alguém (supostamente responsável) critica um plano tem o dever de dizer como faria melhor.
Quintino Silva, Paredes de Coura
Um jogo perigoso
Onde foi o líder da extrema-direita portuguesa buscar o fundamento para achincalhar o povo turco com a opinião de que “não é propriamente conhecido por ser o mais trabalhador do mundo”? Ao vento que passa? Ouviu dizer? Leu algures? (A quem? O quê? Onde?) A Os Sete Pilares da Sabedoria, não foi de certeza. Se no parlamento turco, um deputado decidir agora, sentindo-se (e com razão) ofendido, retorquir, com uma máxima sobre os portugueses, irá este irresponsável aventureiro português gabar-lhe a liberdade de opinião? Ou irá acusá-lo de crime de traição à (nossa) pátria?
Maria Afonso, Lisboa
Os turcos e a liberdade de expressão
O nosso tempo tem sido ocupado por múltiplos debates, opiniões, abaixo assinados, etc., tudo originado por uma simples metáfora utilizada por André Ventura (A.V.) a propósito do dobro do tempo necessário para construir o aeroporto de Alcochete, versus o de Istambul, e com o dobro das pistas.
Em primeiro lugar, a intervenção de A.V. não era sobre os turcos. Em segundo lugar, usou uma metáfora sobre os turcos e não os acusou de serem burros, preguiçosos ou outro qualificativo mais forte. Dizer, no contexto em que o disse, não serem os turcos conhecidos por serem o povo mais trabalhador do mundo foi algum insulto ou anátema lançado sobre o povo turco? Só wokistas radicais, os que não sabem português, nem o que é uma metáfora, poderão ver aqui um crime hediondo, ou então querem simplesmente subjugar e calar todos os que não aceitam o pensamento único e, consequentemente, acabar com a liberdade de expressão. Esteve muito melhor que esses senhores a embaixada da Turquia, que não se deu ao trabalho de perder tempo com uma palermice.
Armando Carvalho, Barcarena
Liberdade de expressão
“Posso não concordar com o que você diz, mas defenderei até à morte o seu direito de dizê-lo.” Esta citação, com que Evelyn Beatrice Hall, em 1906, tenta resumir o pensamento de Voltaire, poderia ter sido proferida pelo presidente da Assembleia da República no recente debate acerca do discurso de André Ventura.
A exaltação e todos os discursos inflamados que o líder do Chega desperta desde há muito com as suas afirmações racistas, irracionais e provocatórias mais não fazem do que alimentar a confusão e a divisão artificial da nossa sociedade, desviando a atenção e o empenho do que é verdadeiramente importante e que urge resolver: o acolhimento digno e dentro da lei dos que aqui querem viver e trabalhar, independentemente da cor da pele ou da raça.
Num programa sobre a educação de cães – Dogs behaving badly –, o treinador ensina que, quando o cão ladra intempestivamente, o dono não deve ralhar gritando, deve sim repreender com serenidade e firmeza os comportamentos inadequados. Talvez este ensinamento se adapte aos seres humanos…
Isabel Ribeiro, Lisboa