A definição de estratégias nacionais para o desenvolvimento da Defesa Nacional de qualquer país e, consequentemente, das Forças Armadas e de cada um dos seus ramos, é uma matéria de grande complexidade política. Na atualidade, essa definição não pode ser feita sem atender ao contexto internacional (cada vez mais desafiante), à incerteza do desfecho dos atuais conflitos e à imprevisibilidade da escalada dos atuais e de eventuais novos conflitos regionais.
Mas não só: a evolução na política norte-americana e os impactos desta na NATO, a evolução na política europeia e o estabelecimento de consensos na área da Defesa Europeia, bem como na Indústria de Defesa Europeia, são outras questões que enquadram hoje esta área. Como facilmente se compreende, as decisões tomadas por Portugal na Defesa Nacional precisam de boa fundamentação técnica, mas também de uma Visão política à altura dos desafios.
Neste sentido, o estabelecimento de um amplo consenso político em torno da Lei de Programação Militar (LPM) é um passo determinante para a aquisição, modernização e adaptação dos meios operacionais dos três ramos das Forças Armadas Portuguesas. Isso é ainda mais verdade no que diz respeito à aquisição de novas capacidades em cada um deles, sendo consensual que em 2023 houve uma adaptação da LPM aos novos desafios de contexto.
Percebemos que a celeridade de adaptação das estratégias nacionais de cada país se torna obrigatória, bem como a flexibilidade de todos os instrumentos de aplicação dessas estratégias. Dessa capacidade dependerá uma melhor ou pior resposta aos desafios do presente e do futuro.
Este é, pois, o momento para enfrentar com coragem esses desafios, mas também de rever prioridades de investimento para antecipar eventuais necessidades operacionais das Forças Armadas Portuguesas em cada um dos seus três ramos. Um desses desafios está atualmente na esfera da Força Aérea com a necessidade de fazermos uma reflexão sobre as suas esquadras de caças de combate.
Colocam-se dois caminhos possíveis: manter a capacidade de controlo do espaço aéreo nacional, continuando a fazer adaptações e atualizações ao Programa dos caças F-16 (hoje com cerca de três décadas de serviço, em média); ou ganhar capacidade de projeção de meios para os novos desafios geopolíticos, e, neste caso, tomar a decisão de investir num novo programa e numa nova capacidade instalada, através da aquisição do caças F-35.
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Jack Guez/AFP via Getty Images
Dirão alguns que a decisão é simples. Outros argumentarão que equipar as Forças Armadas será sempre um desafio secundário, devendo os meios para esse investimento ser canalizado para outras áreas. Na verdade, têm ambos razão, pois a decisão é verdadeiramente básica de um ponto de vista estratégico e operacional, mas muito complexa atendendo à realidade financeira do país.
Numa decisão desta envergadura atuam normalmente duas análises: uma relacionada com a expectativa política sobre a existência e o progresso evolutivo dos conflitos nos quais Portugal poderá ser chamado a contribuir no âmbito dos seus compromissos ao nível multilateral (ONU; NATO e União Europeia); e uma outra relacionada com os próprios desafios bélicos e exigências de projeção de meios das Forças Armadas portuguesas.
Avançar para aquele paradigma a que a Força Aérea Portuguesa chama de “Força Aérea 5.3” – considerando a sua Missão de “participar, de forma integrada, na Defesa Militar da República …” – é um requisito indispensável para garantir o progresso da Força Aérea, mas também da aquisição de novas capacidades. Esse paradigma passa por dotar a Força Aérea Portuguesa de meios e capacidade para dissuadir e derrotar em espaço de combate aéreo os possíveis adversários em todos os cenários bélicos imagináveis.
Mas passa também pela materialização de um processo de aproximação às demais forças aéreas que têm já processos de modernização em implementação, com aquisições feitas ou em curso dos referidos F-35. Esta é, aliás, uma realidade que leva a que a obsolescência do programa dos F-16 se torne real, tendo já disparado o custo com a sua manutenção, bem como do valor de uma possível adaptação e atualização de versão.
Ao contrário, a entrada no Programa dos F-35 aproximará a nossa Força Aérea das demais e ainda permite otimizar o seu produto operacional, com os inerentes ganhos para o País. Com isto pretende-se aplicar as novas capacidades ao nível da criação de uma rede de sensores, decisores e executantes que permitirão uma maior conetividade entre parceiros.
Uma das consequências positivas será também a sincronização dos índices de decisão em cenário de formação e em cenário real de combate. E, também, o alinhamento da Força Aérea com a sociedade civil, gerando ganhos óbvios que farão a médio prazo baixar de forma decisiva o valor do programa.
Ao nível técnico, este programa vai garantir uma redução da assinatura de radar dos caças de combate, garantindo uma maior “invisibilidade”, e uma maior análise de contexto operacional, com o incremento dos sensores avançados multidisciplinares. Bem como um aumento na partilha de informação em tempo real para operações conjuntas, a garantia de melhoria de capacidades dos pilotos e demais recursos humanos, além do óbvio aumento da quantidade e tipos de armamento com que os F-35 podem operar.
Uma questão muito sensível é mesmo o custo deste Programa, que, segundo o Chefe de Estado Maior da Força Aérea, General Cartaxo Alves, poderá ascender a 5,5 mil milhões de euros num período temporal de 20 anos. Refira-se que, já na atual Lei de Programação Militar ficaram inscritas verbas para avançar com os estudos necessários para a sua implementação.
Esse primeiro sinal é muito importante: assinalou a vontade para avançar, a curto prazo, com a modernização da Força Aérea. Ficou assim expressa a existência de vontade política.
Em resumo, o atual contexto geopolítico europeu e mundial, mas também o regresso de um moledo convencional de conflito em que a supremacia aérea é fundamental, tornam necessária a adaptação das Forças Armadas portuguesas através da execução da LPM. O aumento de verbas demonstra bem o compromisso político do anterior Governo.
É agora, cada vez mais, urgente uma clarificação do atual Governo, nomeadamente do atual Ministro da Defesa Nacional. As opções que venham a ser tomadas, ou a falta delas, serão decisivas para o programa Força Aérea 5.3, mas também para o desenvolvimento da própria Defesa Nacional e para o fortalecimento da soberania de Portugal.