A diretora da Portugal Filmes sublinha a relevância de se “tratar de um filme independente, em que o cineasta tem liberdade para decidir o caminho a seguir”. O cinema português vive um bom momento, nota ainda Ana Isabel Strindberg, lembrando que em fevereiro de 2023, o “Mau Viver” de João Canijo venceu o Urso de Prata, na Berlinale, em Berlim.
Filipa Reis, produtora do “Grand Tour”, espera que este prémio funcione como um estímulo para a política cultural portuguesa. “É um prémio que, espero, seja um incentivo para a política cultural e para que haja um reforço do investimento no cinema e na cultura como um todo”, avançou a proprietária da produtora Pedra no Sapato, ao Expresso. Filipa Reis, que também é realizadora, defende que um prémio em Cannes para o cinema português acaba por atrair o olhar para a arte portuguesa, e isso deve ser valorizado.
Levar o cinema português ao mundo
Ganhar um prémio destes dá notoriedade não só ao realizador, mas também a todo o ecossistema do cinema português – atores, produtores, distribuidores, aponta Ana Isabel Strindberg. “O filme será distribuído em vários países do mundo. Todos os produtores vão querer projetar este filme, mostrá-lo. Isso vai fazer com o que o cinema português chegue a muitos sítios onde não costuma chegar“, destaca.
Filipa Reis explica que o filme, antes de ter recebido o prémio, já tinha um agente de vendas internacional e admitiu que, neste momento, ainda não consegue medir o impacto na distribuição após o prémio.
A vitória em Cannes acabará por significar para o realizador acesso mais fácil a financiamento para futuros filmes. O “Grand Tour” custou 4,5 milhões de euros. Não é o primeiro prémio internacional de Miguel Gomes, que ganhou o prémio Alfred Bauer, no Festival de Berlim, com o filme “Tabu”, em 2012.
Este é também um prémio para a produtora, a Pedra no Sapato, de Filipa Reis, nota Ana Isabel Strindberg. O filme que deu um prémio a Miguel Gomes no 77º Festival de Cinema de Cannes começou a ser pensado há seis anos. Foi feito em coprodução com Itália, França, Alemanha, China e Japão. “Sempre soube que tinha um filme incrível e muito bonito entre mãos”, admite Filipa Reis.
Um prémio para a liberdade e a ousadia
O prémio atribuído pelo Festival de Cannes a Miguel Gomes “significa que vale a pena apostar na liberdade que tem sido dada ao cinema português”, salientou Filipa Reis, citada pela agência Lusa, após a cerimónia de encerramento do festival.
“Sabendo que não somos um país com grandes capacidades financeiras, temos apostado na possibilidade de arriscar em projetos que são de autor. Ou seja, os autores têm a possibilidade de criar livremente e isso é o mais precioso no nosso cinema e acho que é o que nos trouxe até aqui”, acrescentou então a produtora.
“Enquanto produtora do próximo filme do Miguel, [o prémio em Cannes] dá-me uma expectativa – espero que seja cumprida – de que o próximo filme poderá ter um financiamento mais rápido e em menos tempo. Porque um dos problemas do cinema português é que, como o financiamento é baixo, demoramos muitos anos a conseguir completar os filmes. A minha ambição é que o próximo filme do Miguel chegue às salas de cinema mais rápido do que chegou este”, explicou ainda.
José Filipe Costa, cineasta e realizador dos filmes “Linha Vermelha” e “Prazer Camarada”, sublinha também a importância dos prémios de um Festival como o de Cannes para o cinema português. “Apesar de achar que a competição festivaleira se tornou uma corrida desenfreada de galgos – somos, como realizadores obrigados a entrar no jogo. E, se assim é, então que haja um prémio para o cinema do Miguel Gomes e a sua equipa. É sinónimo de mais visibilidade para o cinema português ousado”, disse ao Expresso. E acrescentou: “E, que isso traga claro, orçamentos mais altos para a produção dos filmes feitos em Portugal.”
O próprio Miguel Gomes destacou a importância do prémio para o cinema. No discurso que fez quando recebeu o prémio das mãos de Win Wenders, Miguel Gomes agradeceu ao cinema português, sublinhando a raridade que é haver filmes portugueses na competição oficial. E estendeu o agradecimento a “grandes cineastas” como Manoel de Oliveira, que o inspiraram a fazer cinema.
“Grand Tour” não tem ainda data de estreia anunciada. Filipa Reis, noticiou a Lusa, aproveitou Cannes para trabalhar a produção do próximo filme de Miguel Gomes, o já revelado “Selvajaria”, a rodar no Brasil, a partir da obra literária “Os Sertões”, do escritor brasileiro Euclides da Cunha.