Quem tivesse passado as últimas 24 horas alheado do mundo e agora saísse à rua no Dubai teria dificuldade em compreender o que se tinha passado. A manhã acordou limpa e soalheira na cidade mais populosa dos Emirados Árabes Unidos, mas sobrou o cenário de devastação: foi como se o céu tivesse caído.
Choveu tanto num só dia — mais de 254 milímetros em 24 horas, de acordo com o centro meteorológico nacional — como a média de precipitação num ano e meio. É o valor mais elevado de que há registos, desde 1949.
“O Centro Nacional de Meteorologia anunciou que os Emirados Árabes Unidos testemunharam as maiores quantidades de precipitação dos últimos 75 anos, e que a região de Khatm al-Shakla, em Al Ain, testemunhou 254,8 mm de precipitação em menos de 24 horas, tendo o país alcançado um evento excepcional nos registos da sua história climática”, anunciou fonte oficial do Governo na rede social X.
A chuva ainda há-de voltar ao Dubai, mas menos intensa do que na tempestade histórica que atravessou a região na última terça-feira, e que, ao fim de três dias, ainda ameaça Omã. Vinte pessoas morreram à conta das chuvas torrenciais.
Nos Emirados, um homem de 70 anos perdeu a vida no emirado de Ras Al Khaimah, no norte do país, quando o carro em que seguia foi arrastado pelas chuvas que transformaram as estradas em autênticos rios. Outras 19 pessoas morreram em Omã, incluindo algumas crianças, em comunidades que ficaram inundadas pela chuva.
Embora as fortes chuvas tenham diminuído ao longo da noite, as perturbações continuaram na quarta-feira, com a companhia aérea Emirates a suspender o check-in dos passageiros que partiam do aeroporto de Dubai, transformado num autêntico lago, até à meia-noite.
O Aeroporto Internacional de Dubai é um dos mais movimentados do mundo, mas admitiu que estava a enfrentar interrupções significativas, uma vez que que as fortes chuvas atrasaram ou desviaram voos, afectando também a disponibilidade das tripulações.
Enquanto Omã se prepara para mais um dia de chuvas torrenciais, os Emirados Árabes Unidos dedicam-se a limpar as estradas e a recuperar os estragos nas casas e edifícios. O Governo impôs aos funcionários públicos que trabalhassem remotamente e ordenou às escolas que as aulas fossem leccionadas à distância pelo segundo dia consecutivo.
Há estradas destruídas, casas danificadas e garagens de arranha-céus debaixo de água. Em alguns vídeos, que circulam nas redes sociais, é possível ver carros — alguns deles de luxo — a serem arrastadas pelas torrentes que invadiram as ruas.
A Sheikh Zayed Road, uma estrada com 12 pistas que atravessa o Dubai, ficou parcialmente inundada, deixando condutores presos num engarrafamento que se estendeu por quilómetros e que se prolongou por horas. Um jogo de futebol entre o Al Ain dos Emirados Árabes Unidos e o Al Hilal da Arábia Saudita, na semi-final da Liga dos Campeões da Ásia, foi adiado por pelo menos 24 horas por causa do mau tempo. No metro do Dubai, a água chegava à altura dos tornozelos.
Um estudo publicado em 2020, ainda antes dos avisos do COP28 sobre a vulnerabilidade dos Emirados Árabes Unidos a grandes flutuações meteorológicas à conta das alterações climáticas, já avisava que a região iria assistir a “um aumento robusto na precipitação média anual”.
“Em três cenários de emissões, a precipitação média anual na Península Arábica deverá aumentar de 3,76 a 31,83% até ao final do século XXI. As zonas do noroeste da Península Arábica registam uma redução significativa, enquanto as zonas do sul da Península registam um aumento significativo da precipitação média anual até ao final do século XXI”, diz o estudo.