Ainda Miguel Pinto Luz, o ministro das Infraestruturas, respondia a perguntas dos jornalistas na residência official do primeiro-ministro, já o secretário-geral do PS, Pedro Nuno Santos, estava a anunciar o seu “apoio inequívoco” à decisão do Governo de escolher o Campo de Tiro de Alcochete para localização do novo aeroporto de Lisboa . Assim que o primeiro-ministro terminou a sua comunicação, o líder socialista apressou-se a colar-se à decisão, assumindo que tinha havido “articulação” com o Governo e que tentou colar ao seu passado como ministro das Infraestruturas.
“Nunca tivemos dúvidas de que Alcochete era a melhor localização para o novo aeroporto”, afirmou Pedro Nuno Santos, lembrando a decisão que o próprio tomou quando era ministro (e que foi desautorizada por António Costa). “Há dois anos, quando tomei essa decisão, ela não foi irrefletida, o país já levava 50 anos a estudar localizações. Havia na minha opinião condições para decidir de forma ponderada a localização Alcochete”, defendeu o agora líder do PS, na declaração que fez na sede socialista, em Lisboa.
Pouco depois seria o líder parlamentar do PSD, Hugo Soares, a lembrar no Parlamento, que a despacho de Pedro Nuno do verão de 2022 tinha uma grande diferença: previa também a utilização do Montijo.
Pedro Nuno Santos saúda ainda o anúncio dos estudos para a criação da terceira ponte sobre o Tejo. “Mesmo que não houvesse aeroporto em Alcochete, a terceira ligação do Tejo era muito importante para ligar o norte ao sul do país”, diz o socialista, lembrando ainda a ligação entre Lisboa e Madrid. “Saudamos a decisão e queremos dar nota do apoio inequívoco do PS” a essa outra infraestrutura de grande dimensão.
Questionado sobre se tinha havido contactos com o executivo previamente, o líder do PS respondeu que foi ouvido e que essa “articulação aconteceu”.
José Fernandes
As reações dos restantes partidos foram-se sucedendo no Parlamento, enquanto o ministro continuava a falar ali ao lado, na residência oficial, onde decorreu o Conselho de Ministros durante a tarde e onde Montenegro quis fazer o anúncio à hora dos principais noticiários televisivos. No Parlamento, só o PAN se manifestou contra a escolha.
“Esta decisão prova que votar PS ou PSD é mais ou menos a mesma coisa. Estamos perante uma decisão do Bloco Central que é apenas política”, criticou a líder e deputada única do PAN. Inês Sousa Real questionou se a decisão tem por base critério ambientais e de qualidade de vida. “Não podemos ter decisões que põem em causa a avifauna”, afirmou a deputada, que também discorda da construção da terceira travessia sobre o Tejo. E pediu mais relatórios que sustentem esta decisão.
Também André Ventura aproveitou para atirar tanto ao Governo como ao PS. O líder do Chega criticou Pedro Nuno Santos por congratular-se com a decisão do Governo e apontou a “incapacidade” do Governo dizer quanto tempo vão demorar as obras. “Qual a razão para a primeira pista só estar construída dentro de 13 anos? Quanto é que se vai gastar a mais como esta decisão? Qual é o calendário para a construção? Ora, nada disto foi explicado”, afirmou.
“Boa parte do país questiona-se porquê esta decisão”, disse ainda Ventura, que discorda que a decisão tenha por base apenas o relatório da Comissão Técnica Independente (CTI) , que acusou de estar sob suspeita de beneficiar Alcochete para a localização do novo aeroporto.
As desconfianças de PCP e Bloco
Já a esquerda também manifestou desconfianças, mas sobretudo sobre o que esta escolha pode envolver para a Vince, empresa concessionária da ANA. “A questão principal são as contrapartidas”, afirmou a líder do Bloco de Esquerda. Mariana Mortágua disse que Alcochete é a decisão acertada, mas, sabendo que não era a decisão que a ANA pretendia, a coordenadora do BE questiona como é que o Governo entrou em pré-acordo com a ANA.
“É importante que a prioridade das prioridades seja a construção do novo aeroporto”, assinalou, por seu lado, António Filipe, pelo PCP. Para o deputado comunista a prioridade que é dada à expansão do aeroporto Humberto Delgado “não é um bom sinal”. Essa expansão vai ao encontro dos interesses da Vinci e pode ser uma “medida lesiva do interesse nacional”.
Ainda à esquerda, Rui Tavares, do Livre, saudou a decisão do Governo por Alcochete ser a melhor solução, mas também por ser uma “decisão que vem de trás” e que este executivo não pôs em causa. O deputado lembra que o aeroporto da Portela “é um perigo para a cidade” e tem “níveis de ruído intoleráveis”.
Tavares deixou já o aviso para que os terrenos que venham a ser libertados na Portela não sirvam para especulação imobiliária. O atual aeroporto “ocupa terrenos que serão muito importantes para uma transição ecológica da capital do país e também para ajudar a resolver crise da habitação”, defendeu Tavares, que também quer esclarecimentos sobre os efeitos que esta decisão venha a ter na relação entre o Governo e a Vinci, concessionária da ANA.
Os elogios da AD
A fazer a defesa do Governo, o PSD falou numa “decisão histórica”, uma vez que “há muitos anos que o país discutia” o novo aeroporto. Hugo Soares, líder parlamentar do PSD, disse mesmo que este “não é um dia bom para o Governo, é um dia bom para Portugal”.
Notando também a escolha “feliz” do nome Luís de Camões, Hugo Soares salientou que a decisão sobre o novo aeroporto não é igual à que Pedro Nuno Santos tomou há dois anos: “Pedro Nuno Santos não decidiu a localização em Alcochete”, o que “o despacho decidiu era fazer obras na Portela, avançar com o Montijo e Alcochete. Foram três decisões para três aeroportos diferentes”, lembrou Hugo Soares.
“É uma decisão histórica e um dia importante para o país”, disse também o líder parlamentar do CDS, Paulo Núncio, que concluiu: “É um Governo que está em funções há mês e meio e já fez mais do que o anterior Governo em oito anos.”