O Livre volta atrás e vai manter as eleições primárias abertas para a escolha dos candidatos para as Europeias de 9 de junho. Após os recursos apresentados por Francisco Paupério, primeiro classificado na primeira volta, e outro membro Fábio Ventura, o Conselho de Ética e Arbitragem do partido deu razão aos argumentos apresentados e decidiu que a votação da segunda volta deve acontecer, tal como o inicialmente previsto, num processo aberto a votantes externos.
A votação tinha sido adiada por 24h e limitada a membros por decisão da Comissão Eleitoral, que apontava para “fortes indícios de viciação” por parte de não membros do partido, na primeira volta, que apoiaram o candidato Francisco Paupério, que há um ano anunciou a sua candidatura e tem feito campanha desde essa altura. Decisão que foi alvo de críticas dentro e fora do partido.
O órgão admite que a Comissão Eleitoral fez bem em adiar a segunda volta das eleições face às suspeitas, contudo, sublinha que não foram respeitadas as regras do regulamento das primárias, ao ter sido anunciado “sem fundamento adequado” a restrição da votação a membros, deixando de fora os votantes externos inscritos.
“Dá-se provimento aos recursos interpostos e determina-se que a segunda volta das primárias devem permitir o voto não só de membros e apoiantes, mas também daqueles que se inscreveram no processo eleitoral, nos termos previstos no Regulamento de Primárias do Livre“, pode ler-se na deliberação do Conselho de Ética e Arbitragem a que o Expresso teve acesso.
O órgão interno do Livre reuniu-se na noite desta quarta-feira, tendo decidido que a votação na segunda volta se deve realizar, como o previsto no regulamento, também com participação dos votantes externos, inscritos para as primárias do Livre, a partir de quinta-feira.
Segundo o Conselho de Ética são compreensíveis as preocupações da Comissão Eleitoral face à “anormalidade estatística” da votação em Francisco Paupério, que contou com 52% dos votos de membros que votaram apenas num candidato (no Livre, é possível votar em vários candidatos). Reconhece que a votação no biólogo foi sobretudo dependente do voto de inscritos, que não são membros/apoiantes do Livre e que a Comissão Eleitoral atuou com “reta intenção” com vista a salvaguardar os interesses do partido, mas não encontrou causa-efeito na vantagem da votação do candidato que ficou em primeiro lugar na 1.ª volta.
“Não foram apuradas quaisquer condutas concretas que traduzam uma viciação do processo eleitoral. É legítimo aos candidatos em primárias abertas procurarem mobilizar os seus eleitores, muito embora o exercício do direito de voto nas primárias abertas deva seguir a lógica de ordenação de uma lista de candidatos, ao invés da escolha de um cabeça de lista”, nota o órgão do qual faz parte Ricardo Sá Fernandes.
Sem provas concretas, o Conselho de Ética considera assim que não faz sentido suspeitar de práticas incorretas, “infrações dolosas” ou “negligentes” por parte do candidato ou dos seus apoiantes. “Não é legítimo especular sobre a possibilidade dessas práticas poderem ter existido, quando na verdade podem não ter existido, sendo a votação fruto dos termos em que decorreu a campanha eleitoral de Francisco Paupério, iniciada, de resto, com grande antecedência”, acrescenta.
O vencedor da primeira volta, com 3 560,23 pontos, e membro da Assembleia do Livre, confessou ao Expresso “estranhar” a decisão da Comissão Eleitoral Ética, alegando que ia “contra o espírito do partido” e das primárias. Mas agora opta por remeter-se ao silêncio até ao fim do processo.
Partido pondera refletir sobre primárias
Ainda, assim o Conselho de Ética não descarta que o partido deve refletir sobre o processo de primárias, após 10 anos, e “acautelar situações inesperadas”, definindo, por exemplo uma “diferente ponderação” para a votação, entre não membros e apoiantes, com vista a evitar situações semelhantes no futuro.
O tema não é, contudo, consensual, sendo o processo de primárias abertas do Livre único num partido português e muito valorizado pelos membros e apoiantes. Face à decisão da Comissão Eleitoral, entretanto anulada, mais de uma centena de apoiantes assinaram um abaixo-assinado a exigirem a manutenção das regras definidas no regulamento, criticando a “decisão insensata” a “meio do processo” eleitoral.
Luísa Álvares, membro co-fundador do Livre, avançou também com pedido de recurso e apresentou uma queixa contra os cinco membros da Comissão Eleitoral, alegando que estava em causa a violação do regulamento das primárias, os estatutos e o código de ética do partido. “Fechar um processo eleitoral a membros e apoiantes é, precisamente, o contrário de ser aberto aos cidadãos. Como pode um micro partido político de um micro país da União almejar tais românticos objetivos se nem em casa própria assegura a integridade e a democraticidade de umas eleições internas?”, atirou.
De acordo com Luísa Álvares, o Livre defende que nas primárias abertas devem ser garantidos os princípios da democraticidade, da igualdade de oportunidades e da transparência, e havendo “vantagens” e “desvantagens” no processo, o partido deverá refletir sobre o tema, mas não propõe mudanças concretas, como o Conselho de Ética. “Após 10 anos de Primárias Abertas, não há eventos, dados e recuo histórico suficientes para uma investigação independente das primárias abertas do Livre com vista à sua melhoria?”, questionou.
A divulgação dos resultados da segunda volta devia acontecer na sexta-feira, de acordo com calendário inicialmente previsto, mas com o adiamento da votação, só deverá ocorrer na segunda-feira.