Quando Cláudia Jardim sobe a palco vai com tudo, porque é uma força da natureza, tem sangue na guelra, muito sainete, a sua voz enche um teatro e as suas personagens transbordam com o seu carisma e magnetismo. Ah! e tem a melhor gargalhada para enfrentar as catástrofes e tempestades. Recordo a sua interpretação épica no espetáculo “Tropa Fandanga”, da Companhia Teatro Praga, em 2014.
Uma criação que revisitou a Revista à Portuguesa, com José Raposo no elenco, e mostrou como a Revista pode ser bonita, alegre, estouvada, sacudir os espíritos e as mentes e aplaudir a vida de pé. Cláudia também parece aplaudir a vida de pé, apesar de todas as dores e tragédias que ela contém.
Atriz e diretora artística da Praga, voltou a repetir a experiência o ano passado com a co-criação do espetáculo “Bravo 2023”, desta vez com Marina Mota que esteve como cabeça de cartaz, e também ao seu lado, já que Cláudia contracenou e dividiu o camarim com Marina, para premiarem o pior e o melhor do ano, com amor e ironia, porque não são de ficar caladas.
O percurso de Cláudia vai a muitos lugares felizes e criações fora de série, principalmente no teatro, mas também no cinema e televisão. Cláudia diz de si que tem tido uma vida comum rodeada de pessoas extraordinárias.
Aos 12 anos, Cláudia foi para o grupo de Teatro de liceu porque os seus amigos tinham-se inscrito e ela não queria ficar sem ter o que fazer aos sábados à tarde.
Cláudia usa o palavrão que começa com F para expressar a emoção desse momento transformador – um amor que ficou para a vida. Ali no teatro, Cláudia sentiu que tinha super poderes e era livre. Foi o teatro que a ajudou a libertar-se?
Cláudia Jardim conta neste episódio que tentou duas vezes o Conservatório – mas não entrou. Tinha 18 anos quando lhe bateram com a porta na cara e chorou muito. Mas continuou. Os seus pais já a tinham ensinado que as coisas dão trabalho, mas que chegar aonde quer está apenas nas suas mãos. E chegou. Chegou à companhia de Lúcia Sigalho, e à Praga, quase simultaneamente.
Em 2000, com 22 anos estreou “As Dedicatórias” – um espetáculo muito bem recebido pela crítica e pelos pares – que “foi uma bomba” na sua vida. Com Lúcia Sigalho diz que aprendeu tudo o que sabe e com a Praga tem sido uma relação para a vida.
Nesta conversa a atriz conta que o primeiro ano da vida da sua filha foi o último ano de vida da sua mãe. Nas palavras de Cláudia “dir-se-ia um crossfade perfeito.” Porque ganhou uma e perdeu outra. Muitas lágrimas vieram e muitas mais virão, para curar o que tiver que curar e seguir em frente. “Foi um processo avassalador. Mas desde o primeiro dia que cheguei da maternidade a casa lembro-me de olhar para Beatriz e pensar ‘a única coisa que preciso é que te tornes uma pessoa decente e que sejas livre.”
Cláudia trabalhou esporadicamente na Cornucópia, com a Plataforma 285 ou com o Cão Solteiro. Colabora regularmente com os artistas plásticos Vasco Araújo, Javier Nuñez Gasco e João Pedro Vale e Nuno Alexandre Ferreira, com quem apresentou Palhaço Rico Fode Palhaço Pobre. Mais recentemente, no cinema, integrou o elenco de “Fogo Fátuo” de João Pedro Rodrigues
E na Praga diz que é pau para toda a obra: carrega cenários, lava casas de banho, revê orçamentos, anda pelo país e mundo com um ciclo de Shakespeare e constroi com os seus camaradas uma utopia a que chama “casa”. Quais as utopias que a fazem continuar? Quem é Cláudia Jardim na fila do pão? É ouvirem.
Matilde Fieschi
A Beleza das Pequenas Coisas
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Como sabem, o genérico é assinado por Márcia e conta com a colaboração de Tomara. Os retratos são da autoria de Nuno Fox. E a sonoplastia deste podcast é de João Ribeiro.
A segunda parte deste episódio será lançada na manhã deste sábado. Boas escutas!