Já passaram os anos em que a Europa via os seus líderes serem mortos com alguma regularidade. Na primeira metade do século XX, com duas guerras, regimes fascistas e desintegrações de monarquias e impérios, ainda foram mortos líderes de alguma importância, em França, Espanha, Roménia e até em Portugal. Em 1914, foi o homicídio de um chefe de Estado, o arquiduque austríaco Francisco Ferdinando, a precipitar o mundo para a sua Primeira Grande Guerra.
Mas as cenas a que a Eslováquia assistiu na quarta-feira, com a tentativa de assassinato contra o primeiro-ministro Robert Fico, deixaram de ser comuns no velho continente: desde 1973, foram assassinados cinco chefes de Estado, apesar de uns quantos terem sido alvos de tentativas falhadas.
O último líder europeu a ser morto foi Zoran Djindjic, morto a 12 de março de 2003, em Belgrado. Djindjic era primeiro-ministro da Sérvia desde 2001 e era um dos principais rostos da oposição a Slobodan Milosevic, o deposto líder jugoslavo, tendo sido morto com um tiro no coração por um membro das forças especiais sérvias, após uma série de medidas que visava combater o crime organizado no país.
Antes do ex-líder da Sérvia, o último chefe de Estado a ser morto foi o primeiro-ministro sueco Olof Palme, um dos pais da social-democracia na Europa, que liderou a Suécia entre 1969 e 1976 e depois entre 1982 e 1986. Deixou, de resto, um legado na reforma e consolidação do modelo social da Suécia, que inspirou mudanças semelhantes nos países nórdicos.
A violência política na Suécia era praticamente inexistente – o último líder a ser morto no país fora o rei Gustavo III, em 1792. Como tal, Palme regressava do cinema no dia 28 de fevereiro de 1986, sem guarda-costas, acompanhado pela sua mulher, quando foi morto a tiro à queima-roupa. Em 2020, as autoridades encerraram a investigação, concluindo que o assassino deverá ter sido Stig Engström, que morrera em 2000. O trabalho das autoridades foi muito criticado pela imprensa e especialistas e a responsabilidade pela morte de Palme continua a não ser clara.
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Em Portugal, a década ficou marcada por um atentado. Na noite de 4 de dezembro de 1980, pouco depois de descolar de Lisboa em direção ao Porto, o avião onde seguia o então primeiro-ministro Francisco Sá Carneiro despenhou-se em Camarate, morrendo o chefe de Governo, o ministro da Defesa, o chefe de gabinete do primeiro-ministro e o resto da comitiva. Em 2015, a X Comissão Parlamentar de Inquérito à Tragédia de Camarate concluiu que a queda do avião “deveu-se a um atentado”.
Os anos 80 ainda tiveram uma mediática tentativa de assassinato, que não teve sucesso. Em maio de 1981, o Papa João Paulo II – que é chefe do Estado do Vaticano – foi baleado duas vezes em plena Praça de São Pedro, no Vaticano. Mas o Sumo Pontífice sobreviveu e perdoou Mehmet Ali Ağca, com quem depois manteve uma relação próxima e incomum.
Antes, nos anos 70, houve dois assassinatos na Europa do Sul, e ambos foram incidentes muito macabros. Em março de 1978, o antigo primeiro-ministro italiano e líder dos democratas-cristãos, Aldo Moro, foi raptado em Roma por membros das Brigadas Vermelhas, uma milícia terrorista de cariz marxista-leninista, que exigiram a libertação de alguns dos militantes que tinham sido presos. Dois meses depois, Moro – que até era favorito para ser eleito presidente antes do sucedido – apareceu morto na bagageira de um carro.
Finalmente, Luis Carrero Blanco, primeiro-ministro espanhol e um dos homens-fortes ao longo de toda a ditadura franquista, foi vítima de um atentado bombista pelo grupo separatista basco ETA, numa rua em Madrid, no dia 20 de dezembro de 1973.
Tirando estes líderes, há ainda alguns casos de ministros e líderes da oposição assassinados, sob circunstâncias políticas ou não. Por exemplo, Anna Lindh, que em 2003 era ministra dos Negócios Estrangeiros da Suécia, foi esfaqueada até à morte numa loja de roupa no centro de Estocolmo, mas o seu homicida recusou que tivesse motivações políticas. Mais clara foi a morte de Pim Fortuyn, um político holandês que criticava a imigração e a comunidade muçulmana, e que, em maio de 2022, foi atingido a tiro e morto por um ativista dos direitos dos animais a apenas nove dias das eleições legislativas.
Outros líderes que sobreviveram a tentativas de assassinato desde 1973 incluem nomes grandes. Em 2002, um homem tentou alvejar o presidente francês Jacques Chirac enquanto este assistia a uma cerimónia na Bastilha, mas falhou; em 1984, a primeira-ministra britânica Margaret Thatcher safou-se por pouco de um atentado bombista da organização terrorista irlandesa IRA, que destruiu um hotel em Brighton e matou cinco pessoas; e, em 1990, pouco depois da reunificação da Alemanha, o político Wolfgang Schäuble (que se tornaria ministro das Finanças de Angela Merkel e um conhecido dos portugueses) foi alvejado três vezes nas costas, e passou a ficar limitado a uma cadeira de rodas.
Existe, ainda, um líder europeu que foi executado pela justiça. O ditador romeno Nicolae Ceaușescu, que liderou a Roménia e o Partido Comunista Romeno entre os anos 60 e 1989, tentou fugir à revolução de dezembro desse ano e ainda escapou de Bucareste de helicóptero com a esposa. Porém, o exército conseguiu apanhá-los e ambos foram executados após um julgamento sumário, no dia 25 de dezembro de 1989.
Portugal tem um pequeno histórico de líderes assassinados ou que morreram em situações pouco esclarecedoras e, só no século XX, houve duas mortes na liderança do país, antes de Sá Carneiro.
Em 1908, ocorreu o histórico regicídio de D. Carlos I e do seu herdeiro, Luís Filipe, ambos mortos por ativistas republicanos no Terreiro do Paço, em Lisboa. Dez anos mais tarde, em fevereiro de 1918, o presidente ditador Sidónio Pais foi morto no Rossio (Lisboa) por José Júlio da Costa, um ex-sargento do exército e militante republicano.