Tbilissi encheu-se de manifestantes, terça-feira, depois da aprovação parlamentar do projeto de lei sobre “influência estrangeira”, também conhecida por “lei russa”. Este diploma tem sido criticado por se assemelhar à legislação utilizada pelo regime russo contra a oposição.
Em frente ao Parlamento, cerca de duas mil pessoas concentraram-se e entoaram em conjunto “Não à lei russa!”, rodeados por forte presença policial, segundo um correspondente da agência France-Presse (AFP) no local. Mais tarde, os manifestantes bloquearam uma artéria no centro da capital. Treze deles foram presos “após desobedecerem às ordens da polícia”, segundo o Ministério do Interior.
Num sinal da tensão atual, os representantes eleitos da maioria e da oposição entraram em confronto durante os debates. Brigas semelhantes já tinham ocorrido nas últimas semanas.
Os protestos contra este texto legal, que visa os meios de comunicação social e as organizações não-governamentais (ONG) que recebem fundos estrangeiros, já duram há mais de um mês. Espera-se que a Presidente georgiana, a europeísta Salomé Zourabichvili, vete o texto, mas o partido no poder, Sonho Georgiano, afirma ter votos suficientes para anular esse veto.
ONG prometem não recuar
“Vamos manifestar-nos até que este Governo russo deixe o nosso país!”, jurou Salomé, manifestante de 20 anos, logo após a votação. “Eles tentam negar os últimos 30 anos”, ou o caminho percorrido desde a queda da URSS, vincou Mariam Javakhichvili, de 34 anos, depois de ter estado no meio da multidão em protesto.
As ONG garantiram que, apesar da pressão e da intimidação, nunca se submeterão à lei agora aprovada. Baïa Pataraïa, líder de uma das principais organizações de direitos das mulheres na Geórgia, encontrou, certa manhã, cartazes com a sua fotografia, designando-a como “agente estrangeira”.
O Governo georgiano garante que a lei visa simplesmente obrigar as organizações a demonstrarem mais transparência sobre os fundos que lhes chegam do exterior. Argumenta que grupos como o de Pataraïa representam um risco para a soberania da Geórgia. A jovem ativista rejeita a acusação: “Tudo o que faço é pelo meu povo, pelo meu país e, na verdade, por mais ninguém”.
Ocidente critica, Moscovo aplaude
Pouco antes da votação, um porta-voz da UE reafirmou que a adoção deste texto constituiria um “grave obstáculo” no caminho da adesão da Geórgia ao bloco comunitário.
O vice-secretário de Estado dos Estados Unidos, James O’Brien, que se encontrou em Tbilissi com o primeiro-ministro georgiano, Irakli Kobakhidze, alertou que Washington irá adotar “sanções financeiras e restrições de viagem contra os indivíduos envolvidos” e rever a ajuda de 390 milhões de dólares (360 milhões de euros) atribuída este ano por Washington. No Reino Unido, a secretária de Estado dos Assuntos Europeus, Nusrat Ghani, apelou ao Governo georgiano para “retirar esta legislação”.
O ministro dos Negócios Estrangeiros da Lituânia, Gabrielius Landsbergis, realçou à AFP que irá à Geórgia com os seus homólogos islandês, estónio e letão para expressar “preocupações aos líderes políticos”. Também o Ministério dos Negócios Estrangeiros português lamentou “profundamente a adoção da lei pelo Parlamento da Geórgia”.
O porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, elogiou “o firme desejo dos líderes georgianos de proteger o seu país contra qualquer interferência flagrante”. A controvérsia em torno deste texto também destaca a influência de Bidzina Ivanishvili, rico empresário considerado um governante paralelo da Geórgia.
Primeiro-ministro de 2012 a 2013 e hoje presidente honorário do Sonho Georgiano, Ivanishvili é suspeito de proximidade com a Rússia, país onde fez fortuna. Embora alegue querer trazer a Geórgia para a UE, fez recentemente declarações hostis em relação ao Ocidente e vê as ONG como inimigo interno, num país que vai a eleições legislativas em outubro.