Desiludido com a calmaria de Vila Franca de Xira, que contrastava com o ambiente vivido na capital, o repórter fotográfico decide voltar a Lisboa, onde acontecia uma revolução que iria marcar a história de Portugal e da Europa.
No caminho, encontra um carro militar parado. Tinha um furo num pneu. “Foi o único carro militar que vi na minha ida a Vila Franca. Legendei essa fotografia de: ‘Um furo no 25 de Abril’. Achei piada”, conta.
Com a redação em alvoroço, a Fernando foi dada a tarefa de fotografar a Junta de Salvação Nacional, mas “não sabia a que horas iriam aparecer, nem quem eram eles”. Sabia-se apenas que iam discursar nos estúdios da RTP.
Acabaram por chegar já de madrugada.
Conta que pediu várias vezes a uma família que morava perto da RTP para que o deixasse telefonar para casa, para garantir que a mãe estava bem e segura.
Moravam numa casa no Chiado, numa esquina entre o Quartel do Carmo, o Governo Civil de Lisboa e a PIDE. “Pensava eu que se houvesse fogo cruzado, a minha casa era logo ali no meio e a minha mãe, coitada, estava ali. Mas para espanto meu, contou-me que esteve entretida à janela a ver o movimento”, revela.
O fotojornalista conta que atrás da câmara gosta de fotografar o pior, a tristeza e a tragédia, e que só se apercebe da realidade quando afasta a cara da lente. Mas se agora tem liberdade para o fazer, antes do 25 de Abril de 1974 não era assim.
“Realmente havia censura”, sublinha, recordando as fotografias que fez de uma partida de imigrantes que tinham vindo a Portugal na época natalícia.
“Os familiares ali em Santa Apolónia [em Lisboa] a despedirem-se deles lavados em lágrimas. E qual não foi o meu espanto quando disseram que a fotografia não podia sair porque a censura não autorizou. Fiquei um bocado surpreso e desiludido”, conta.
Conta que algumas das personalidades que mais gostou de retratar foram a estrela do futebol Maradona, os atores franceses Brigitte Bardot e Daniel Gélin, o cirurgião Christiaan Barnard, que realizou o primeiro transplante de coração do mundo, e Salazar a beijar a mão do Cardeal Cerejeira. Mas há uma fotografia que recorda com especial emoção: a imagem da rainha Isabel II na sua visita a Portugal, a 27 de fevereiro de 1957. “Ainda hoje não sei se ela estava a acenar para mim”, conta.
Corrêa dos Santos começou a fotografar aos 13 anos e continua, ainda hoje, a passear de máquina na mão e de olho atento ao que se passa à sua volta. Gosta de captar as situações reais, o que acontece no dia a dia, as histórias que surgem à sua frente.
Mas depois de uma vida passada atrás de uma objetiva, a fotografar a realidade, confessa: “Ainda não tirei a fotografia da minha vida”.