O discurso de Luís Montenegro desta quinta-feira na abertura do debate do programa do Governo previa poucas surpresas, especialmente após a divulgação do programa no dia anterior. Ainda assim, o primeiro-ministro aproveitou a ocasião para esclarecer as prioridades até ao verão e para os próximos 60 dias, o prazo informal definido pelo próprio em frente ao Parlamento.
A principal novidade foi anunciada logo a abrir, fazendo antecipar um intenso debate sobre as contas do Estado e a utilização do excedente orçamental deixado pelo anterior Governo. Montenegro prometeu uma redução do IRS até ao oitavo escalão, para avançar já na próxima semana, prevendo uma “diminuição global de cerca de 1500 milhões de euros nos impostos do trabalho dos portugueses face ao ano passado, especialmente sentida na classe média” – precisamente o excendente orçamental previsto pelo Conselho de Finanças Públicas para este ano.
O primeiro-ministro também deixou “para breve” um programa “para colocar o Estado a pagar a 30 dias”, que incluirá a Autoridade Tributária e as empresas numa primeira fase, sendo depois “alargada a toda a administração central”.
Aos professores e às forças de segurança, cujas reivindicações marcaram os últimos dois anos da governação e até o principal debate nas legislativas, Luís Montenegro garantiu que vai iniciar-se nos próximos 10 dias “conversações com os representantes dos professores e das forças de segurança, com vista a tratar de assuntos relacionados com as carreiras e estatuto remuneratório”. As negocições das carreiras do setor da saúde, ou funcionários judiciais (incluídas na carta de Pedro Nuno Santos a Montenegro, abrindo negociações para um Retificativo), assim como os militares (pedido por Marcelo) ficaram de fora, para já: “Serão as nossas duas primeiras prioridades”, disse Montenegro.
Quanto aos exames nacionais, tendo em conta as “graves falhas na disponibilização de equipamentos informáticos” nas escolas, o primeiro-ministro confirmou também que as provas de aferição do 9.º ano serão realizadas em papel este ano, já que “13.639 alunos do 9º ano não receberam o Kit digital-portátil, pen de dados e acessórios”. A decisão cinge-se apenas ao presente ano letivo, mas as provas de aferição são para voltar ao formato digital “de modo a sinalizar o empenho na transição digital”.
Para combater a crise na habitação, que afeta Portugal e a grande maioria dos países europeus, Montenegro disse que será apresentada “uma nova política de habitação” nas próximas semanas. A nova diretriz governativa prevê a revogação do arrendamento forçado – uma medida implementada pelo plano “Mais Habitação”, do executivo do Partido Socialista -, a já prometida isenção do IMT e do Imposto de Selo para os jovens que comprarem a sua primeira casa, a revogação do imposto adicional e das suspensões de licenças aplicadas aos alojamentos locais, entre outras propostas.
Relativamente aos fundos europeus, Montenegro apontou para a baixa execução dos fundos alocados ao Portugal 2030 e ao Programa de Recuperação e Resiliência (PRR), e sublinhou que o Governo vai “criar as condições para apresentar o pedido de libertação” de 713 milhões de euros em fundos retidos por Bruxelas, dentro dos próximos 60 dias.
No combate à corrupção, uma das grandes bandeiras do PSD ao longo da campanha eleitoral, o chefe do Governo notou que, nesta primeira semana, já foi assinado o despacho que determina “a abertura de concurso para reforçar em 60% o número de inspetores especializados neste combate”.
Ainda na área do combate à fraude, Luís Montenegro disse que a publicação sobre a aplicação dos fundos comunitários passará a ser obrigatória na imprensa local e nacional, uma alteração à lei que “já está agendada” para o próximo Conselho de Ministros, considerando que “publicitar os fundos nos sites dos serviços públicos é positivo, mas não é suficiente”. “Quem ler ‘O Mensageiro de Bragança’ ou o ‘Jornal do Fundão’ ficará a saber que fundos foram atribuídos para investimento naqueles concelhos”, exemplificou.
O novo Governo da Aliança Democrática também pretende “promover de imediato o agendamento de uma reunião da Concertação Social, com vista a discutir com os parceiros sociais as bases de Um Novo Acordo que consagre o reforço dos rendimentos e da produtividade dos trabalhadores portugueses e a competitividade e crescimento da nossa economia”.
O programa do novo Governo seguiu as linhas do programa eleitoral da AD, com algumas cedências, reversões e novas medidas que não constavam nas promessas eleitorais da coligação. Pode consultar as principais mudanças que o executivo quer levar a cabo aqui.
O documento com as linhas orientadoras do Governo deve ser aprovado pela Assembleia da República na sexta-feira, com a abstenção já anunciada pela nova líder parlamentar do Partido Socialista, Alexandra Leitão. No entanto, a proposta de redução do IRS, por ser uma matéria de alteração fiscal, esta tem de ser debatida e aprovada no Parlamento (algo que deve acontecer na próxima semana).