Os europeus estão muito mais atentos às eleições europeias que se realizam em 27 países entre 6 a 9 de junho do que estiveram às anteriores. Só em França o interesse no tema se mantém em linha com o registado em 2019, antes das últimas europeias; nos restantes países, os inquiridos dizem estar hoje mais interessados no ato eleitoral do que há cinco anos.
No quadro geral, 60% dos europeus afirmam estar interessados no ato eleitoral de junho, o que representa um aumento de 11 pontos percentuais em relação à primavera de 2018, antes das anteriores europeias. Nalguns países, o aumento é muito significativo.
São os casos da Croácia (mais 24 pontos percentuais do que em 2019), Chéquia (mais 22 pontos) e Lituânia (20 pontos). No caso croata, é apenas a terceira vez que a população é chamada a votar para o Parlamento Europeu (a adesão concretizou-se em 2013) e a primeira depois de ter adotado a moeda única. Os portugueses também estão mais entusiasmados com as eleições de 2024 do que com as de 2019: nesse Eurobarómetro, 36% da população dizia-se interessada no ato eleitoral, agora são 51%.
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À medida que as eleições se aproximam, 53% dos europeus afirmam que é importante votar nas europeias e, mais significativo, 71% dizem que vão votar. Este dado está correlacionado com a perspetiva de futuro: os cidadãos que dizem que provavelmente votarão nas europeias têm quase o dobro da probabilidade de estarem otimistas quanto ao futuro da UE, em comparação com os que indicam que provavelmente não irão votar.
O apelo de Roberta Metsola
“Estas eleições serão cruciais, porque decidirão o rumo que vamos tomar. Terão uma palavra a dizer na definição do futuro da Europa. Votem. Não deixem que ninguém decida por vós. Se a democracia ganhar, todos os europeus ganham. Para que isso aconteça, conto com todos. Usem o vosso voto”, disse a Presidente do Parlamento Europeu, Roberta Metsola, num vídeo gravado para a apresentação dos resultados aos jornalistas, terça-feira.
As estatísticas apresentadas não trazem explicações em anexo, mas há outros estudos, mais qualitativos, que podem ajudar a explicar por que razão a UE é hoje percecionada como uma organização mais central na vida diária dos europeus do que há cinco anos.
Em 2019 não tinha havido uma pandemia e não tinha rebentado uma guerra na Europa. O referendo do Brexit já tinha acontecido, mas o corte definitivo do Reino Unido com a UE, que mergulhou muitas empresas britânicas que exportavam para o espaço europeu em sérias dificuldades económicas e nem sequer conseguiu reduzir o número de imigrantes no país, bem pelo contrário, só viria a ser assinado em janeiro de 2020.
O contexto internacional é o fator decisivo: oito em cada dez europeus dizem que estas eleições são mais importantes por causa da situação geopolítica. “As eleições de 6 a 9 de junho ocorrem num momento crítico, numa altura em que os cidadãos estão a navegar pelas implicações socioeconómicas de uma situação geopolítica complexa. Como revela o Eurobarómetro do Parlamento Europeu, os europeus estão conscientes de que o que está em jogo nas urnas é muito importante. Oito em cada dez europeus afirmam que votar é ainda mais importante tendo em conta esse contexto”, disse ainda Metsola.
Os temas para a campanha
Os temas que os europeus desejam ver tratados nas campanhas também não são os que poderíamos antecipar. A crise migratória, tão presente nos noticiários e nos discursos de alguns políticos, não aparece entre as primeiras cinco preocupações dos inquiridos (só em sétimo lugar).
Na primeira posição está uma preocupação bem mais estrutural: a pobreza e a diminuição da exclusão social (33% dos inquiridos, que podiam escolher até quatro prioridades). Logo a seguir aparece o investimento em saúde pública (32%), em terceiro a economia e a criação de emprego (31%), depois a defesa e segurança do espaço europeu (31%), e em quinto lugar a luta contra as alterações climáticas (27%).
A agricultura, devido aos protestos dos agricultores em várias cidades europeias nos últimos meses, mas também por causa do preço dos alimentos durante um duro período de inflação, tornou-se nos últimos meses um novo tópico das preocupações dos europeus, que não aparecia em sondagens anteriores.
Se aproximarmos a lupa, vemos que estas prioridades não são sentidas de igual forma entre os vários países. Por exemplo, na Dinamarca (56%), na Finlândia (55%) ou na Lituânia (53%), a defesa é, de longe, o que mais preocupa as pessoas.
Já Portugal (55%), Croácia (46%) e Roménia (42%) veem como prioridade a situação económica e o emprego. Na Grécia (56%) a maior preocupação é a saúde, tal como na Irlanda (46%) e em Espanha (45%). A luta contra a pobreza e exclusão social é o tópico central para os belgas (48%), franceses (42%) e luxemburgueses (41%). Só em Chipre (41%) e Malta (50%) a questão das migrações e asilo aparece em primeiro lugar entre as preocupações dos inquiridos. Na Suécia, é o clima que mais inquieta (58%).
As diferenças entre as respostas este ano e em 2019, antes das europeias desse ano, dão-nos pistas sobre os acontecimentos mais importantes dos últimos cinco anos. A saúde pública é a principal preocupação na Grécia, Irlanda, Espanha, Hungria e Eslovénia, mas em 2019 nem aparecia entre as prioridades. A defesa da UE estava longe de ser questão proeminente há cinco anos, o que contrasta com as opiniões recolhidas após a invasão da Ucrânia pela Rússia, em fevereiro de 2022.
Apesar de parecer claro que a pandemia é dos grandes temas dos últimos cinco anos, a forma como os europeus avaliam a resposta dos 27 à covid-19 difere de país para país. Um recente estudo do Conselho Europeu para as Relações Internacionais mostra que Portugal e Espanha são os únicos Estados-membros onde se considera que pertencer ao espaço comunitário ajudou a lidar com a pandemia.
Há divergências noutros domínios. No caso das políticas ecológicas, Portugal e Suécia são, de entre os países europeus, os únicos onde a maioria da população diz que não se importaria com um aumento na fatura de energia se estivesse diretamente ligado à adoção de políticas que comprovadamente reduzissem as emissões de carbono.
Quase metade dos europeus veem nível de vida a descer
Tendo em consideração que uma maioria de europeus pede atenção à pobreza, à exclusão social e à economia na próxima legislatura, é natural encontrar nas perguntas sobre o nível de vida e finanças pessoais indicadores menos positivos. Olhando para os últimos cinco anos, a maioria dos europeus diz que o seu nível de vida se manteve (49%) mas um número muito próximo (45%) refere estar pior do que há cinco anos. Apenas 6% dizem que o seu nível de vida melhorou.
A evolução negativa é especialmente proeminente em nove países: Grécia (74%), França (69%), Chipre (63%), Espanha (58%), Portugal (56%), Chéquia (50%), Bélgica (49%), Irlanda (48%) e Malta (46%). Uma maioria relativa de europeus espera que o seu nível de vida se mantenha inalterado no futuro (49%), com 32% a pensar que irá diminuir e 15% que irá aumentar.
Dito isto, 61% (mais um ponto percentual) declaram-se otimistas quanto ao futuro da UE, contra 35% que se dizem pessimistas. Em todos os Estados-membros menos um (França), há uma maioria otimista quanto ao futuro da UE. Percentagens que atingem um máximo de 83% na Dinamarca, 81% na Irlanda e 78% na Lituânia e diminuem para 42% em França, 51% em Chipre e na Chéquia.
Mais força para o Parlamento Europeu
A imagem do Parlamento Europeu (PE) é mais positiva do que em estudos anteriores, nos quais aparecia como “neutra” ou mesmo “negativa” nalguns países. O Eurobarómetro mostra que, em relação ao inquérito feito há três meses, a ideia que os europeus têm do PE é cinco pontos mais positiva, em média, atingindo os 41%. É a primeira vez que a imagem positiva excede a neutra, que caiu de 44% em setembro-outubro de 2023 para 40% no inquérito atual. A imagem negativa manteve-se estável em 18%. Mas há diferenças significativas de país para país. Por exemplo: 66% dos inquiridos portugueses têm uma imagem positiva do PE, contra 27% dos franceses.
Neste último Eurobarómetro, 56% dos inquiridos admitem que gostariam que o PE tivesse ainda mais força e influência na UE. Durante a pandemia, esse número atingiu 63%, mais um dado que parece mostrar que a importância das instituições europeias cresce, na opinião pública, em tempos de incerteza. De novo, as variações são expressivas a nível nacional. Em Chipre, 85% das pessoas gostariam de um PE com ainda mais peso nas decisões europeias, já na Chéquia esse número desce para 32%. Em Portugal, 67% dos inquiridos concordam com o reforço do papel dos deputados que elegemos para a UE.
Paz e democracia: o foco do futuro
Olhando para o próximo mandato, os europeus querem que os eurodeputados se foquem em duas coisas principais: paz (47%) e democracia (33%). Logo depois, pedem mais atenção à proteção dos direitos humanos (24%), à liberdade de expressão e de pensamento (21%) e ao Estado de Direito (20%).
A paz é a resposta mais mencionada em 26 Estados-membros, com as proporções mais elevadas na Lituânia (64%), Letónia (62%), Estónia (60%) e Finlândia (60%), quatro países geograficamente próximos da ameaça russa. A exceção é a Suécia, onde a democracia surge em primeiro lugar, com 45%.
União Europeia
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Já no campo do posicionamento da UE fora de portas, a defesa volta aos lugares cimeiros entre as preocupações, com 37% e eleger este campo como o mais prioritário para a ação externa do bloco. É o tópico mais mencionado em 15 países, com as percentagens mais elevadas na Lituânia (60%) e Finlândia (57%), mas está entre as primeiras três inquietações em 22 dos 27 países.
Em segundo lugar estão as questões energéticas (30%), e em terceiro a segurança alimentar e a agricultura (30%). Competitividade, economia e indústria são referidas por mais de um quarto dos inquiridos (27%). A idade é fator importante na análise destes dados. “Os inquiridos mais velhos são mais propensos a indicar que a defesa e a segurança, a segurança alimentar e a agricultura, bem como a competitividade, a economia e a indústria, devem ser prioridades da UE para reforçar a sua posição global”, lê-se no resumo do estudo. Os mais jovens consideram que “a educação e a investigação, a ação climática e a redução das emissões, bem como a tecnologia e a inovação, incluindo a inteligência artificial, devem ser as áreas de incidência da UE”.
Imagem positiva da UE também cresce
Olhando para o panorama geral da UE, 73% dos europeus (aumento de três pontos desde o outono de 2023), consideram que o que se decide a nível europeu tem impacto na sua vida diária. Destes, 20% (mais três pontos) acreditam que as leis aprovadas pelo PE tem “grande impacto”.
A opinião positiva em relação à UE aumentou significativamente em certos países dsde o último inquérito, no outono de 2023). Na Chéquia, 72% das pessoas dizem ver a UE como organização benéfica, um salto de 12 pontos percentuais, que também se regista na Finlândia (73%, mais nove pontos). A adesão à UE é considerada positiva por uma percentagem estável de europeus (60%, menos um ponto do que no outono de 2023). Além disso, uma maioria significativa (71%) concorda que o seu país beneficiou, no geral, por ser membro da UE, enquanto 23% discordam.
Outro dado importante é este: quatro em cada dez cidadãos afirmam que o papel da UE se tornou mais importante nos últimos anos, enquanto 35% pensam que se manteve igual e 22% que diminuiu. A nível nacional, maiorias relativas em 15 países consideram que o papel da UE no mundo se tornou mais importante ao longo dos anos, com proporções que atingem 67% na Suécia, 63% em Portugal e 60% na Dinamarca. O consumo, ou não, de informação sobre política europeia é um facto que influencia estes números. As que acompanham a política da UE são mais susceptíveis de acreditar que o papel das instituições comunitárias se tornou mais importante do que as que não acompanham (47% contra 30%).
Apesar do apoio mais ou menos consolidado ao projeto europeu entre todos os países da UE, os europeus não perderam a capacidade de a criticar: enquanto 50% estão satisfeitos com a resposta da UE à pandemia de Covid-19, menos de metade sentem o mesmo em relação à resposta da União ao Brexit (38%), à situação económica e financeira (37%), à invasão da Ucrânia pela Rússia (36%), às alterações climáticas (33%) e à migração (24%).